EDUSTAT - Mestrados não estão a melhorar as competências dos diplomados

Mestrados não estão a melhorar as competências dos diplomados

janeiro de 2025

O inquérito do PIAAC (Programme for the International Assessment of Adult Competencies), realizado pela OCDE, tem por objetivo avaliar as competências dos adultos ao nível da literacia, da numeracia e da resolução de problemas.

Realizado em cerca de três dezenas de países, o PIAAC contou pela primeira vez com a participação de Portugal, que apresentou um desempenho desolador: dos 31 países que participaram, Portugal ficou em penúltimo lugar, só à frente do Chile.



Estes resultados demonstram o desalinhamento entre a formação superior em Portugal e o desenvolvimento de competências ao nível da literacia, da numeracia e da resolução de problemas.

Por exemplo, os países da OCDE têm, em média, cerca de 14% da população com mestrado e 1% com doutoramento, e 12% atingem os escalões mais elevados de literacia. Pelo contrário, Portugal tem maior percentagem da população com mestrado (19%), mantendo 1% com doutoramento, mas apenas 4% com os níveis mais elevados de literacia, o que questiona a qualidade dos mestrados oferecidos.

O mestrado 2.º ciclo é uma consequência do processo de Bolonha que veio criar o sistema de dois ciclos (licenciatura + mestrado), substituindo o mestrado tradicional. O crescimento do número de estudantes de mestrado foi muito rápido, em particular nas áreas em que a licenciatura foi reduzida a três anos e, a partir de 2020, devido à eliminação dos mestrados integrados por exemplo nas engenharias e nos cursos de Psicologia. Também se verifica que “a obtenção do mestrado, em média, compensa em termos de resultados no mercado de trabalho. De acordo com os dados do Eurostat para 2021, os detentores de mestrado tinham, em Portugal, uma taxa média de empregabilidade de 92,5% face a somente 82,8% dos detentores de licenciatura. Adicionalmente, o rácio salarial entre mestrado e licenciatura tem vindo a aumentar desde 2013, tendo atingido 1,24 em 2022.



Alunos e diplomados com mestrado (2.º ciclo de Bolonha)

A oferta de mestrados tem vindo a aumentar nos últimos anos, sendo já superior a 1500. A evolução do número de diplomados, sendo bastante inferior ao número de inscritos, aponta para uma falta de eficiência formativa. Estes indícios estão confirmados pelo facto de a taxa de abandono ao fim do primeiro ano ser demasiado elevada (próxima de 30%), enquanto a taxa de sobrevivência (rácio entre o número de diplomados e o número de inscritos no 1.º ano pela 1.ª vez), com valores em torno dos 60%, ser consistente com uma baixa eficiência formativa.



Segundo Aguiar-Conraria, num contexto de subfinanciamento as instituições preocupam-se mais em gerar receitas com os mestrados do que em se focarem na qualidade da educação e na experiência de aprendizagem dos estudantes. Isto é facilitado pelo facto de as instituições operarem num mercado livre: admitem alunos sem as restrições do numerus clausus, decidem quem admitir e fixam as propinas. De acordo com Silva e Sarrico, a baixa eficiência formativa é resultado de fatores como “a baixa exigência de admissão em programas de mestrado, com alunos a entrarem sem as competências necessárias para progredir e concluir com sucesso, a acumulação do estudo com atividades profissionais, falta de recursos materiais e humanos para apoio adequado aos estudantes (o número de orientandos por docente tem vindo a subir muito)”. Os dados do PIAAC vêm responder às dúvidas de Silva e Sarrico: “em que medida o mestrado está de facto a elevar as competências dos diplomados, ou sobretudo a servir como credencial que está a ser utilizada pelos empregadores para triarem e diferenciarem entre candidatos a empregos e ajudá-los a tomar decisões de recrutamento”.